Aumento do preço da água vai deteriorar o poder de compra

 

Aumento do preço da água vai deteriorar o poder de compra




Governo subiu as tarifas de água, depois de protestos pelo aumento do custo de Internet. Economista lembra que o rendimento médio dos moçambicanos não suporta os aumentos, mas duvida que Maputo recue na sua decisão.

Depois do reajuste, há dias, das tarifas de Internet, SMS e voz, a água vai ficar mais cara. Por exemplo, em Maputo, Matola e Boane, vai passar para 64,8 meticais (0,94 euros) contra os anteriores 51 meticais por metro cúbico.

Na cidade da Beira, a tarifa de referência passa para de 47 para 57 meticais (0,82 euros). Em Nampula, vai passar de 53 para 64 meticais, enquanto em Manica, Gondola e Chimoio a tarifa vai passar para 50,24 meticais (0,73 euros) o metro cúbico, como noticiou o jornal online Carta de Moçambique. Para Chongoene, Limpopo e Xai-Xai, a taxa de referência por metro cúbico será de 53,44 meticais, sabendo-se que em Pemba, Murrébuè e Metuge vai custar 59,44 meticais.

A este propósito, a DW África entrevistou o economista moçambicano Egas Daniel, ligado ao Centro Internacional de Crescimento (sigla em inglês IGC - International Growth Centre).

DW África: Depois do aumento do custo da Internet, os moçambicanos são agora confrontados com a subida da tarifa da água em algumas províncias. Como observa estes aumentos, sobretudo da água como um bem essencial? O que é que justifica esta alteração dos preços?

Egas Daniel (ED): Muitas vezes, o aumento costuma ser justificado por quem o faz pela necessidade de aumentar a capacidade de investir em infraestruturas, expandir o serviço. Mas, de qualquer forma, isso contradiz até certo ponto com a situação socioeconómica dos moçambicanos. De notar que nos últimos dez anos praticamente a pobreza urbana e rural aumentou. A urbana, em particular, aumentou de 32 por cento para 45 por cento, segundo dados do Banco Mundial, assim como o PIB [Produto Interno Bruto] per capita reduziu de 750, em 2014, para 550 em 2022, o que mostra que os indicadores de capacidade de pagamento e de consumo das famílias no seu todo deterioraram. Então, isso até certo ponto vai em contramão a esta situação, o que pode – e é inevitável que assim seja – agravar a situação de dificuldade das famílias moçambicanas, principalmente nas cidades onde os preços foram agravados.


DW África: Quais são os efeitos ou as consequências deste aumento da água para os moçambicanos?

ED: É do mesmo rendimento que os moçambicanos devem tirar valores para custear o transporte, a habitação, pagar a renda, para pagar a eletricidade e adicionar este preço da água está-se a aumentar o fardo, que constitui na verdade a inflação nos últimos anos.

O salário mínimo é aquele que aumenta sempre a [conta]-gotas e analisando os últimos aumentos vê-se alguma tendência de aumento pouco compensatório até para os níveis de inflação para alguns setores e, naturalmente, encontra-se pouca margem de manobra para justificar aumentos em bens essenciais como a água. Costuma-se dizer que bens como a água, internet, a educação, o transporte, pelas suas externalidades positivas, os seus impactos para outros setores e o peso que eles têm no rendimento das famílias, convém que todo o aumento seja extremamente cauteloso, controlado e, se possível – a não ser que se esteja no limite – não aumentar esses setores até que a situação do rendimento do moçambicano, como se perspetiva, se verifique nos próximos anos.

Senão, deterioramos ainda mais a situação da qualidade de vida dos moçambicanos.

DW África: No contexto atual, o que significam estes aumentos face ao custo de vida em Moçambique?

ED: O moçambicano médio já despende 27 por cento do seu orçamento para a alimentação e já gasta 16 por cento para transporte. Na habitação e água, praticamente gasta 12 por cento. Um em cada dez meticais é alocado para este setor que inclui a componente de provisão e de consumo de água. O que significa que se está a mexer, na verdade, num fator importante do dia a dia, de sobrevivência dos moçambicanos, num contexto em que a pobreza urbana deteriorou nos últimos dez anos. Então, é inevitável que esta medida esteja a fazer vista grossa a esta condição precária do rendimento médio dos moçambicanos.

Podíamos dizer que nas cidades a situação talvez está melhor, mas é nas cidades que a pobreza urbana também piorou de 32 para 45 por cento nos últimos dez anos. Ou seja, de qualquer jeito, indubitavelmente, este aumento, juntamente com outros aumentos que fomos assistindo nos últimos anos, vai agravar e deteriorar a capacidade de poder de compra dos moçambicanos, obrigando até a fazer reajustes e apertar cada vez mais o cinto, na esperança de que, provavelmente, a situação no futuro volte a melhorar.

Várias ações da sociedade estão em curso junto do Governo para reverter o aumento do preço da internetFoto: Romeu da Silva/DW

DW África: A subida da tarifa de internet através dos provedores de telefone móvel tem gerado contestação em Moçambique. São de se prever protestos também por causa da subida da tarifa da água?

ED: Provavelmente não haverá protestos como houve na componente da subida da internet. Porque em termos percentuais a água subiu em 25 por cento, mas a internet explodiu, quer dizer uma subida extraordinária, duas a três vezes mais. E, por outro lado, a explicação em relação à subida da internet foi extremamente fraca e contradiz teorias económicas básicas de intervenção do Estado na economia.

Para a componente de água, mais uma vez, o Estado é um provedor quase exclusivo, que monopoliza o mercado. Se der uma explicação que seja razoável, há espaço, porque a subida não foi em todas as cidades e não foi na mesma proporção em todas elas; às vezes de 25 por cento para alguns sítios e outros menos.

É possível que se encontre uma margem de comunicação, uma comunicação cuidadosa, que possa fazer compreender o moçambicano, para que não saía às ruas como fez na componente de transporte e de internet. 

DW África: Se houver protestos, acredita que se vai registar um retrocesso por parte do Governo para um ajuste de preços mais equilibrado e aceitável?

ED: Parece que uma em cada cinco medidas é que o Governorecua. Na componente de internet houve um recrudescimento do ponto de vista de recuo. Se olhar para a história, houve apenas recuo na componente das taxas do Ministério da Justiça; as taxas que tinham sido agravadas de forma substancial para o serviço de registo notariado. Aí o Governo recuou e até pediu desculpas, o que foi uma atitude extremamente humilde de se aplaudir. Entretanto, este padrão não é o comum. Daí que se olhar para as estatísticas e para as probabilidades duvido que haja recuos nesta medida uma vez tendo sido já tomada.



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